Wednesday, May 04, 2005

Neocrónica

É engraçado. Engraçadíssimo mesmo. Fala-se muito em neoconservadorismo e em neoliberalismo, mas ninguém ouve falar em neoprogressismo ou em neoestatismo. «Neo» está sempre associado às coisas ditas de direita. Em tom duro. Maldisposto. Amargoso. Por aqui, chamar alguém de «neoconservador» é como atirar-lhe com uma pedra da calçada à marrafa. É como ir no trânsito e abrir a janela para gritar: «Sai lá daí, ó Américo Thomaz do Saldanha Residence!».
Mais: há, segundo 632,2 escribas, uma «nova direita» («os gajos da nova direita» para aqui; «os gajos da nova direita» para ali). Mas ninguém fala numa nova esquerda (a não ser, julgo, Pulido Valente no último fim-de-semana). O que não é lá muito – chamemos-lhe assim - justo. Correcto. Sério. Pois: se é verdade que há um conjunto de novos personagens pensantes à direita, também o é que há um conjunto à esquerda. Podem ser encontradas no bar Agito, ao Bairro Alto.
Até o dicionário da Academia das Ciências de Lisboa – ou melhor o neodicionário da Academia das Ciências de Lisboa – é demasiado canhoto nas escolhas. Sim, deve ter sido revisto por Mário Soares, Miguel Vale de Almeida e um conjunto de estagiários com t-shirts do Che. Há lá no meio apenas uma definição de neoliberalismo - e nadinha do resto.
Pergunto, daqui do neoquarto andar sem elevador (onde habitam algumas neotérmitas): para quando a definição do neolouçãnismo (que já está a surgir em força nas C+S do país)? Para quando o significado de neoantiamericanismo? E de neocaviarismo? Exijo uma resposta. O neoemail está à vossa disposição. Neodisposição, desculpem.
(texto publicado no dia 4 de Maio)