Sunday, May 22, 2005

Lusitana chinatown

A história da inspecção às lojas chinesas fez-me lembrar uma longa conversa promovida por este jornal entre Pacheco Pereira e Eduardo Lourenço. Recordo-me de Pacheco ter comentado, entre outras coisas, que muitos comerciantes portugueses ainda não perceberam o tempo em que vivem. Lamentam-se demasiado e pouco fazem para se modernizarem e se tornarem competitivos.
Já lá estivemos. Agora são eles que cá estão. Sim, Portugal já foi conhecido pelos seus périplos ao Oriente. Agora é conhecido pelo país que quer expulsar - ou, pelo menos, amedrontar - os orientais que lhe vieram prejudicar o negócio. Abram o ouvido: há um cochicho invejoso e mesquinho a rastejar pelas ruelas, tascas e lojas de conveniência: «Olha que os gajos trabalham de mais e têm bugigangas baratas. É preciso ter cuidado com os chinos».
Sabe o que é que dá vontade, dona Genoveva? (Desculpem. É que a senhora apareceu agora aqui em casa para fazer a análise da jogatana de ontem, com o seu poético vocabulário à Rui Santos). Dá vontade de imaginar uma inspecção aos comerciantes portugueses. Uma inspecção daquelas que dão para assustar até um Tarzan Taborda. Uma investida que revele aquilo que já adivinhamos: que seria preciso ter a casa bem limpinha para levantar ondas aos outros.
Mais: dá vontade de imaginar Portugal transformado numa imensa Chinatown. Do mais pirososo – mas eficaz - que pode existir. E com os pequenos comerciantes lusos a serem obrigados a modernizarem as suas lojecas - e a melhorarem o serviço, a qualidade e o preço dos seus produtos. Como já deviam ter feito, aliás.
(texto publicado no dia 19 de Maio de 2005)