Não percebo isto
Se eu fosse o Pierluigi Collina não passava por estes dias no Martim Moniz. Feita a advertência ao senhor (que, contam-me amigos italianos, lê sempre esta croniqueta - e a secção do hoje fazem anos do Público - logo pela matina), é altura de escrever aquilo que vai no que ainda resta da minha melancólica alma: não percebo isto. Não, não percebo isto de andar de cabeça rapada a chatear a cabeça de pessoas de cores diferentes.
Ou melhor: percebo isto, mas não percebo isto (desculpem-me a extrema clareza de pensamento; é do calor). Percebo isto - porque só o humano é capaz dos mais cruéis e parvos extremismos mentais - mas não percebo isto porque isto está tão afastado do meu universo e da minha maneira de ver e sentir que entra no domínio do incompreensível.
O que torna o fenómeno perversamente fascinante. Explico-me melhor: quando os carequinhas de serviço aparecem na televisão, num documentário, numa notícia ou num anúncio de uma sauna, fico preso à coisa - como quem vê um conjunto de hipopótamos que de repente começou a falar sobre literatura arménia. É tão bizarro e tão estúpido (tão absolutamente nonsense) que a gente quer saber o que é que vai acontecer a seguir.
Eu não os enjaulava. Pelo menos para já. Obrigava-os a usar cabeleiras afro e missangas à volta do pescoço. Obrigava-os a, sempre que quisessem pedir uma bica ou uma imperial, exprimirem-se em português com sotaque angolano ou moçambicano. Obrigava-os a escurecerem a pele e a, até ao fim da vida, fazerem parte de grupos de reggae (quanto mais irritantemente repetitivos, melhor). Obrigava-os - aos domingos - a vestir um belo de um turbante. Só depois é que pensava no resto.
ncostasantos@netcabo.pt
Ou melhor: percebo isto, mas não percebo isto (desculpem-me a extrema clareza de pensamento; é do calor). Percebo isto - porque só o humano é capaz dos mais cruéis e parvos extremismos mentais - mas não percebo isto porque isto está tão afastado do meu universo e da minha maneira de ver e sentir que entra no domínio do incompreensível.
O que torna o fenómeno perversamente fascinante. Explico-me melhor: quando os carequinhas de serviço aparecem na televisão, num documentário, numa notícia ou num anúncio de uma sauna, fico preso à coisa - como quem vê um conjunto de hipopótamos que de repente começou a falar sobre literatura arménia. É tão bizarro e tão estúpido (tão absolutamente nonsense) que a gente quer saber o que é que vai acontecer a seguir.
Eu não os enjaulava. Pelo menos para já. Obrigava-os a usar cabeleiras afro e missangas à volta do pescoço. Obrigava-os a, sempre que quisessem pedir uma bica ou uma imperial, exprimirem-se em português com sotaque angolano ou moçambicano. Obrigava-os a escurecerem a pele e a, até ao fim da vida, fazerem parte de grupos de reggae (quanto mais irritantemente repetitivos, melhor). Obrigava-os - aos domingos - a vestir um belo de um turbante. Só depois é que pensava no resto.
ncostasantos@netcabo.pt