Friday, April 29, 2005

o coelho, o lobo, a melga e o rato

A participação de Jorge Coelho no programa Quadratura do Círculo não faz qualquer sentido. Anteontem, apanhei-o a intervir. Previsível: representava o papel de defensor fundamentalista das hostes socialistas. Só lhe faltou fazer o rosáceo elogio da maneira como Sócrates se penteia logo pela manhã e da forma como segura a bica cheia (quem sabe, com o dedo mindinho espetado) no café da esquina.
Porque a questão é esta – e tão somente esta: o programa quer armar-se ao livre. E Jorge Coelho não é um homem livre. Coelho é coordenador da Comissão Permanente do PS. Sim, o nome do cargo diz tudo. Por isso e só por isso se percebe que, por exemplo, na análise que fez do discurso fideliano (na duração) de Jorge Sampaio no 25 de Abril só tenha sublinhado - em tons igualmente rosáceos - a crítica que o presidente fez à obsessão pelo défice.
Pacheco e Lobo são, apesar de tudo, vozes mais libertas dos discursos oficiosos das agremiações em que militam. (Por falar nisso, até quando é que um lobo e um coelho vão conseguir coexistir no mesmo reduto?; ainda não reflecti o suficiente sobre o assunto para me pronunciar; nem sobre o facto de um coelho ter ido substituir uma personagem com óbvio feitio de melga). O primeiro é tão livre, tão livre que mais valia que tivesse a coragem e a generosidade suficientes para realizar uma festarola de despedida. Com o DJ Santana a pôr música, é claro.
É que, além do mais, a coisa pode tornar-se francamente aborrecida. Já adivinhamos quais vão ser as cenas dos capítulos seguintes. Pacheco e Lobo continuarão ao ataque e Coelho permanecerá à defesa. Sim, por mais spots que passem com o próprio a tentar mostrar que até é um espírito livre, nunca poderá sair da actual cartola do Rato. A menos que tenha em mente outras ambições.
(texto publicado no dia 29 de Abril)

Thursday, April 28, 2005

Um homem simples

1) Primeiro o CDS-PP. A nítida vantagem de José Ribeiro e Castro em relação ao seu antecessor é o facto de ser, ou melhor, de parecer um homem simples –«um tipo normal». Não tem o rasgo nem a articulação mental e verbal de Paulo Portas, mas em compensação transpira normalidade e pragmatismo. E, pormenor não irrelevante, veste fatos que se podem comprar na Loja das Meias.
2) Não deixa, no entanto, de ser bastante irónico que o novo líder do CDS-PP, há não muito tempo um partido antieuropeísta, escolha arrumar a casa a partir da Europa. É o mesmo que o Vaticano, num gesto de extremo progressismo, começasse, daqui a cinco anos, a ser liderado a partir dos bares do Príncipe Real.
3) Esqueçam Carlos Marques e Pedro Soares. José Sá Fernandes é o candidato bloquista ideal à Câmara de Lisboa. Sobretudo se começar por exigir um estudo de impacto ambiental sobre algumas das propostas políticas do próprio BE. Sim, pode ser que dê em embargo.
4) É um conselho de amigo: se o filósofo Manuel Maria Carrilho quiser ter algum sucesso nas eleições para a Câmara de Lisboa, deverá dar lugar à primeira dama em matéria de cartazes espalhados pela cidade. Ainda vai a tempo.
5) Uma perguntinha: alguém sabe onde é que anda um indivíduo de cabelo grisalho e boa pinta que se chama qualquer coisa Sócrates?
6) Para finalizar, uma nota de bondade e esperança. De um momento para o outro, os comentadores de assuntos papais (e cardeais e sacerdotais) desapareceram do mapa. Escapuliram-se. Ou esfumaram-se, para sermos mais rigorosos. Um santo alívio para a humanidade.
(texto publicado no dia 28 de Abril)

Wednesday, April 27, 2005

Revistas de gajo

É questão de dar uma voltinha pelos quiosques: o país encheu-se de revistas com moças semi-desnudas na capa. Eu já tenho a novidade do mercado: a FHM. Comprei este segundo número porque sei que traz um dossier completíssimo sobre o tema da semiótica na problemática do estruturalismo pós-moderno húngaro. É um assunto que me interessa muito. Já havia comprado a última Maxmen por causa de uma densa reflexão sobre os neosartreanos.
Sejamos claros: este boom revisteiro só pode ter a ver com o facto de Portugal estar farto de ser chamado de metrossexual e depravado por esse mundo fora. Temos de limpar a imagem. Chegou a altura de parecer um gajo à antiga. O lema é: «Vejam lá, ó estrangeirada, apesar deste look de metrossexual da Baixa da Banheira e dos escândalos tipo Casa Pia, nós gostamos é de mulherio a sério».
Não sei se já repararam. Têm-se visto mais aglomerados de senhores respeitáveis junto das lojecas de jornais. A táctica é simples: um tipo finge que está a olhar para a manchete do Courrier Internacional quando na verdade está a espreitar para a moçoila da GQ. Já há cursos para isso e tudo.
As outras revistas começam a atacar com as armas de que dispõem. Por exemplo, há quem tenha comprado a Nova Cidadania, dirigida por João Carlos Espada, só porque tem um artigo assinado por um tal de Kenneth Minogue (intitulado “Sondagens à Parte”). A julgar pelo Zé Tó, o filho da porteira, o apelido do senhor enganou muito candidato a marialva. Espera-se mesmo um aprofundamento da táctica. Estou a imaginar os colaboradores dos próximos números da Nova Cidadania: Jonathan Galisteu, Francis Spears e Mariso Cruz. Aguardemos.
(texto publicado no dia 27 de Abril)